Relato de participação no XXVI Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação – 21 a 24 de julho – SP
Jéssica de Sá
Participar do XXVI CBBD foi uma oportunidade maravilhosa de me inteirar sobre as diversas questões relacionadas à Biblioteconomia brasileira. É interessante ressaltar a variedade de temas que envolveram o evento e tive a oportunidade de comparecer a um número considerável de mesas redondas, conferências e apresentações de trabalhos, o que me deu um panorama das temáticas abordadas no evento.
O posicionamento dos congressistas teve um ponto em comum: o convite aos bibliotecários ao engajamento, à inovação, ao movimento, à cooperação. Uma questão levantada foi a mudança de paradigma das bibliotecas. O conceito de biblioteca sofre mudanças, ela agora é vista como um espaço dinâmico e social que permite o desenvolvimento do conhecimento. De acordo com Emir Suaiden em sua fala sobre “O futuro das Bibliotecas”, o problema das bibliotecas é conceitual, não se trata mais de conectar coisas e objetos, se trata de conectar pessoas.
Destaco também a palestra de Sueli Ferreira, que convidou os bibliotecários a debaterem sobre a nossa desatualizada Lei de Direitos Autorais, e a palestra de Sérgio Branco, que explicitou sobre o Marco Civil da internet.
Em especial, o 2° Fórum Brasileiro de Biblioteconomia Escolar, evento paralelo ao CBBD, afirmou e reafirmou com todas as suas apresentações de trabalhos (destaque para as apresentações de Helen Casarin e Bernadete Campello), que não é mais o momento de tratar da miséria da biblioteca escolar, sendo possível criar e mostrar exemplos de bibliotecas que funcionam e que contribuem efetivamente na aprendizagem dos estudantes. O fórum ressaltou o papel do bibliotecário como educador, sendo sugerido que esse busque um apoio teórico em um estudo pedagógico para embasar sua prática. As temáticas giraram em torno da leitura, letramento, competências, políticas públicas e relatos de práticas realizadas nas bibliotecas. Conclui-se que é necessário ver as possibilidades de atuação na biblioteca escolar.
Maria L. Amorim AntunesNo dia 21 houve a Cerimônia de Abertura do evento na Casa São Paulo. Ocorreram a apresentação do evento, discursos dos organizadores, sessões de homenagens e uma apresentação artística.
No dia 22 pela manhã, após o credenciamento, foi feita uma visita aos stands dos expositores para conhecer o que há de mais novo no mercado de gestão da informação em termos de produtos e serviços.
A primeira atividade assistida foi uma Apresentação de Trabalho. Da autoria de Jorge Santana, vinculado à UFES, o assunto abordava a formação e desenvolvimento de coleções dentro da perspectiva das bibliotecas na contemporaneidade. Em síntese foi colocado que a formação e o tratamento do material se constituem práticas concretizadas, porém no que se refere à exposição do espaço e à utilização efetiva do acervo pela sociedade constata-se uma lacuna, como se a biblioteca não fosse aproveitada em todo o seu potencial. Isso evidenciou a relevância de pensar intervenções com vistas a divulgar as funcionalidades do espaço ao passo que inspira conciliar a tecnologia presente no cotidiano dos usuários com a atuação da biblioteca.
Após este momento foi assistida a Conferência Bibliotecas Verdes promovendo comunidades sustentáveis, apresentada por Jeffrey Scherer e colegas integrantes da MSR.
À noite, deu-se a Conferência de Emir Suaiden do IBICT. Este icônico pensador da área apontou reflexões sobre o futuro (papel) das Bibliotecas. Ele afirma que desde um passado remoto as bibliotecas (públicas principalmente) brasileiras pouco fizeram para democratizar o acesso à informação. Na sociedade atual (da informação) o papel desta passa a ser cada vez mais vital para atenuar as desigualdades da sociedade brasileira. Segundo ele, a biblioteca precisa acompanhar as tendências e oferecer produtos e serviços racionalmente estruturados em sintonia com a convergência da sociedade. Ele defende a adoção de técnicas de planejamento que orientem os serviços bibliotecários, tendo em vista a reorganização, a melhora da atenção para a comunidade e a criação de uma infraestrutura de recursos materiais e principalmente humanos. Nesta concepção o foco se desloca do material para o sujeito, o desafio agora é conectar as pessoas de forma que estas possam usufruir do que a biblioteca tem a contribuir.
O dia 23 começou com a Mesa Redonda composta por Constanza Mekis, do Chile e Bernadete Campelo, da UFMG. Elas falaram respectivamente sobre a motivação da leitura e o panorama das Bibliotecas Escolares no Brasil. Mekis apresentou o trabalho desenvolvido nos Centro de Recursos para el Aprendizaje – CRA. Ligado ao Ministério de Cultura do Chile, esta instituição se dedica a estimular o interesse na informação, leitura e conhecimento da comunidade escolar através de espaços lúdicos que propiciam uma aprendizagem criativa. Além da estrutura física, a ideologia busca construir no sujeito bases de consciência sobre o aprendizado e a cultura. Após a fala de Mekis, uma das perguntas que mais despertou o interesse foi com relação ao apoio político na educação brasileira. A pergunta: “Como fazer que o bicho da leitura pique os políticos brasileiros?” provocou a reflexão sobre a mentalidade coletiva. As mudanças ocorrem estruturadas na vertical, mas em duas vias. Não traz resultado esperar vir de cima para baixo, acreditar que é unicamente o governo o responsável pela melhoria na educação. Muito da instrução começa na família e se ainda não existe esta consciência, que a escola intervenha neste segmento também, não só esperando realizações através de políticas públicas.
Ao articular sobre o panorama da biblioteca escolar Bernadete diz que apesar desta biblioteca encontrar muitos desafios – como não estar explícita no Plano Nacional de Educação – há muito sendo feito e discutido nesta área: fala dos quatro grandes núcleos de pesquisa em biblioteca escolar no Brasil. Segundo ela, o importante agora é reafirmar nossas crenças e valores; abandonar a atual postura “posição de miséria” e também “acabar com a exaltação”. O que traz diferença é a atitude de “explorar possibilidades” evidenciando as práticas bem sucedidas na aprendizagem.
Bernadete defende uma formação generalista, mas acredita que ainda falta estofo teórico nos currículos; relatos de “como o bibliotecário que está na escola aprendeu a fazer o que faz”. Ela diz que muita coisa ainda não está consolidada e identifica que há uma teoria nascendo da prática: “O que fazem os bibliotecários de sucesso? Estudam, decidem e se viram”. Desponta o bibliotecário com perfil de educador para influenciar na aprendizagem ao invés de exclusivos burocratas, guardadores de livros. O educador não é somente o professor.
Após o almoço, os trabalhos expostos no auditório Turquesa foram acompanhados até o instante de apresentar “o Google e a biblioteca escolar como espaço de pesquisa e aprendizagem” juntamente com Raquel Miranda e Adriana Bogliolo. Após este momento o Fórum de Biblioteca Escolar preencheu o restante do dia. Houve a apresentação de um estudo descritivo sobre o acervo de uma escolar estadual de ensino básico em Florianópolis. Dois trabalhos demonstraram a funcionalidade de softwares para sistemas de biblioteca: um para o público infanto-juvenil com a Prima Informática e o trabalho do software i10 pela Praxis. O trabalho da professora Marília Paiva, apresentado por Adriana Bogliolo (ambas da UFMG), mostrou uma abordagem interessante sobre a contribuição das bibliotecas escolares relacionada à Prova Brasil. A bibliotecária Lilia Santos ressaltou a versatilidade e a multifuncionalidade da profissão ao narrar a experiência que tem em Belo Horizonte. Uma análise de bastante destaque relacionou todo o conhecimento produzido sobre biblioteconomia escolar a partir do CBBD de 2005 a 2013. Duas atividades da UFRJ foram apresentadas: uma relatou propostas de integração da biblioteca escolar com o projeto pedagógico em escolas da rede pública e outra demonstrou uma Ciranda literária dirigida a adolescentes. Por fim o papel educativo do bibliotecário escolar foi evidenciado por Raquel Miranda Vilela de Paiva, da UFMG.
No dia 24, pela manhã, foi feita uma visita ao Museu da Língua Portuguesa. Destacando a exibição do curta “Idiomaterno” que traça as origens da língua e as dinâmicas realizadas pelos organizadores (dentre elas a repetição incessante do verso “Penetra surdamente no reino das palavras”) houve uma grata surpresa ao mostrar que é possível descobrir a poesia e preservar com a mesma uma outra relação. Outro lugar visitado foi a pinacoteca, onde notaram-se as exposições “A paisagem na arte: 1690-1998. Artistas britânicos na coleção da Tate” e “Mulheres artistas: as pioneiras (1880-1930)”.
Pela tarde, novamente as atividades do Fórum. Foram retratados temas como o desenvolvimento de coleções em biblioteca escolar, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul; mais análises sobre a interação da biblioteca escolar com projeto político pedagógico da escola (UFPB) e a biblioteca escolar e à pedagogia dos multiletramentos do SESC.
Após a finalização do Fórum, deu-se a Conferência sobre o Marco Civil da Internet e o porquê é importante para todos. Com Sérgio Branco Jr. foram discutidas as leis que tratam a Internet, o Marco Civil da Internet, o que tratam estas leis, quais os objetivos e o que acontece depois de abril de 2014, data de aprovação (apesar de ser regulamentada através de decreto). Foi utilizada a polêmica de Daniela Cicarelli em 2006 para alimentar as discussões. Falou-se da dificuldade em ter uma lei criminal cujo consenso sobre autoria e responsabilidade seja claro. Entram em cena questões como privacidade, liberdade de expressão, direito de acesso, salvaguarda de sites e blogs, a neutralidade da rede e dados governamentais. O Marco Civil se mostrou mais uma lei principiológica. Outras questões ficaram demais para serem tratada pelo Marco Civil. O palestrante termina indicando o trabalho “memória e esquecimento na internet” da autoria dele, para quem quiser se aprofundar no tema.
Após esta palestra, deu-se o encerramento do evento com a fala de Adriana Cybele reiterando que o convite é para integrar os profissionais das bibliotecas e discutir o segmento de atuação de cada um, reforçando a área. Foram ouvidos comentários de que a cada edição o evento cresce mais um pouco, fato que só tem a enriquecer o campo. Diante da desconcertante variedade de temas surgiu a dúvida de selecionar e conseguir acompanhar o que despertou a curiosidade. Apesar de impossível assistir todas as apresentações de interesse, foi uma oportunidade fantástica perceber que os bibliotecários estão produzindo bastante conhecimento e se mostrando dispostos ao engajamento e a colaboração. Esta participação no CBBD incentivou muito tentativas de apresentações futuras no CIBES e Painel de SC. |